Você sabia que muitas mulheres só vão conhecer realmente sua vulva depois da vida adulta? Isso porque fomos criadas numa cultura que silencia o corpo feminino, trata a genitália como um tabu e muitas vezes nem menciona o nome correto das partes. Quando falamos “lá embaixo” ou “partes íntimas”, estamos perpetuando uma vergonha que não deveríamos carregar.
Conhecer a própria vulva é um ato de liberdade, saúde e autoestima. É também um primeiro passo para exercer autonomia sobre o próprio corpo. Quando sabemos o que é normal para o nosso corpo, conseguimos perceber alterações e buscar ajuda médica com mais segurança. Além disso, esse conhecimento contribui para melhorar a relação com o prazer e com a sexualidade, seja sozinha ou com alguém.
Coloque um espelho em frente à sua vulva. Observe sem julgamentos. Nomeie o que vê. Reconheça sua forma, cor, textura, e entenda que cada detalhe é legítimo. Saber o nome de cada parte do seu corpo é um gesto de amor-próprio e de resistência.

É muito comum ouvir pessoas chamando tudo de “vagina”, mas a verdade é que essa palavra se refere apenas ao canal interno, que conecta a vulva ao útero. Ou seja, aquilo que a gente vê ao se olhar com um espelho é a vulva, e ela tem várias estruturas importantes.
Vulva é toda a porção externa da genitália feminina — composta pelos lábios maiores e menores, clitóris (e seu capuz), abertura da uretra, entrada da vagina e monte pubiano, enquanto a Vagina é um canal interno que conecta a entrada da vulva ao colo do útero. É por onde passam o fluxo menstrual, a penetração durante o sexo vaginal e o bebê no parto normal (ACOG, 2024).
A vulva também inclui os grandes e pequenos lábios, o clitóris (que está parcialmente coberto pelo capuz), a abertura da uretra (por onde sai o xixi) e a entrada da vagina. Já a vagina em si é um canal interno com cerca de 8 a 10 cm de comprimento em repouso, e que tem elasticidade para se expandir durante o sexo ou o parto.
Saber essa diferença ajuda a conversar melhor com o ginecologista, a descomplicar o cuidado com a saúde íntima e a desmistificar o corpo feminino. Também é um passo importante para desnaturalizar o apagamento histórico da vulva, que por muito tempo foi deixada de fora até dos livros de anatomia.
Existe um padrão certo?
Uma das maiores causas de insegurança feminina em relação ao corpo está justamente na região íntima. Muitas mulheres acreditam que têm “algo errado” na vulva porque ela não se parece com o que viram em revistas, filmes ou redes sociais. Mas isso é um mito.
O Brasil lidera o ranking mundial de labioplastias (redução dos pequenos lábios). De acordo com a International Society of Aesthetic Plastic Surgery, houve um aumento de 45% nesses procedimentos em 2016; somente no Brasil foram 23.155 cirurgias (ISAPS, 2017). Esse dado denuncia como a pressão estética transforma características naturais em “defeitos” a serem corrigidos cirurgicamente.
Não existe uma vulva “certa”, existem vulvas! Umas mais rosadas, outras mais escuras. Com lábios simétricos ou assimétricos. Com pelos mais grossos, finos, encaracolados ou sem pelos. O clitóris pode ser mais aparente ou mais coberto.
Mas será que precisamos mesmo alterar algo que é funcional e natural? Nosso corpo não está aqui para atender expectativas externas. Está aqui para nos proteger, nos dar prazer e nos conectar com quem somos.
Há pêlos lisos, encaracolados, encarapinhados, claros, escuros... O formato dos lábios também é diversificado: os maiores podem ser grandes e encorpados por tecido adiposo, enquanto os menores variam entre finos, avantajados, protuberantes, rugosos ou assimétricos. Já o capuz do clitóris pode ser caído, enquanto o tamanho e a proeminência do próprio clitóris podem variar de mulher para mulher. Essas são apenas algumas das particularidades existentes na área vulvar.
Qual a função da vulva?
Naturalmente, a região externa do genital a qual chamamos de vulva possui muitas funções. É pelo canal da uretra que liberamos a urina e é pelo canal da vagina que liberamos a menstruação e por onde acessamos o colo do útero. Portanto, a vulva está envolvida no processo de reprodução humana.
Mas é também na vulva onde se encontra o clitóris, um órgão cuja única função é de proporcionar prazer e que está diretamente relacionado aos orgasmos. E ainda as glândulas Betsey & Lucy e glândulas Skene, que são responsáveis pela lubrificação e pela ejaculação feminina, respectivamente, e que estão ligadas ao nosso ciclo de resposta sexual. Ou seja, estão envolvidas com a nossa excitação e desejo!
Por séculos a sexualidade da mulher é silenciada assim como as informações sobre nosso corpo. Por isso, preparamos um guia definitivo do órgão de prazer feminino! Sobre o clítoris, acesse aqui nosso guia completo.

Como tratar sua vulva
1. Pelos pubianos: tirar ou manter?
De acordo com a BURRIS apud Healthline (2019) removê-los é uma escolha estética pessoal, mas deve ser feita com cuidado, evitando agressões à pele e infecções. Vale lembrar que os pelos têm uma função de proteção natural, atuando como barreira contra bactérias, sujeiras e até atritos causados por roupas. Se você optar por depilar, prefira métodos menos agressivos, como a lâmina (com hidratação posterior) ou a cera, sempre em ambiente higiênico.
2. Sabonete íntimo: usar ou evitar?
A vagina possui um sistema autolimpante e autorregulador do pH. Usar sabonetes íntimos diariamente pode alterar esse equilíbrio, favorecendo infecções como candidíase ou vaginose bacteriana (ACOG, 2020). Se quiser usar, que seja com moderação e sem fragrâncias artificiais. Lavar a vulva com água e sabonete neutro já é suficiente.
3. Roupas e ventilação
Evite usar calcinhas de tecidos sintéticos e muito apertadas por longos períodos. Prefira algodão e, se possível, durma sem calcinha. A ventilação da região íntima ajuda a evitar infecções fúngicas e mantém a pele saudável.
6. Doenças frequentes
Algumas das infecções mais comuns na região vulvovaginal, de acordo com MSD Manuals (2023) incluem:
- Candidíase: causada por fungos, provoca coceira intensa, ardência e corrimento branco.
- Tricomoníase: infecção sexualmente transmissível com corrimento amarelo-esverdeado e odor forte.
- Clamídia: muitas vezes assintomática, mas pode causar dor pélvica e infertilidade se não tratada.
- Herpes genital: vírus que causa feridas dolorosas e recorrentes.
- HPV: vírus transmitido sexualmente, que pode causar verrugas e está relacionado a cânceres ginecológicos.
A prevenção continua sendo a forma mais inteligente e eficaz de cuidar da saúde íntima. Usar camisinha em todas as relações sexuais, manter os exames ginecológicos em dia, visitar o ginecologista com regularidade e, acima de tudo, prestar atenção aos sinais do próprio corpo são atitudes que fazem toda a diferença.
Lembre-se: alterações no corrimento, cheiros incomuns, coceiras, dores ou feridas não devem ser ignoradas. O autoconhecimento é um aliado poderoso na detecção precoce de infecções e outras condições.
E o melhor: você não precisa enfrentar isso sozinha. O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece gratuitamente preservativos, consultas ginecológicas, exames preventivos como o Papanicolau e testes para infecções sexualmente transmissíveis. Aproveitar esses recursos é um direito seu e uma forma de se colocar em primeiro lugar.
Quais doenças podem se manifestar na vulva?
As mais frequentes são HPV, que pode se manifestar dermatologicamente por lesões verrucosas nessa região; sífilis, cuja infecção primária leva a uma úlcera genital geralmente indolor; e herpes genital, caracteriza por dor e feridas genitais (múltiplas lesões). Sempre tenha um acompanhamento ginecológico e mantenha seus exames atualizados, além, é claro, de prevenir-se. USE CAMISINHA (o Sistema Único de Saúde – SUS – oferece gratuitamente).
De 2015 a 2016, a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética observou um aumento de 45% no número de procedimentos de labioplastia (cirurgia para reduzir o tamanho dos pequenos lábios). Apesar da recomendação de que a operação seja realizada apenas em mulheres adultas, mais de 200 meninas com menos de 18 anos realizaram o procedimento nestes anos. Já existem casos de meninas de até nove anos que realizaram a cirurgia devido a inseguranças sobre a aparência de sua genitália. Dá para perceber a gravidade desse assunto? São crianças, meninas, jovens e mulheres adultas inseguras com algo que é normal e natural do seu corpo.
Vulvite e vulvovaginite
Um bom exemplo de doenças na vulva-são inflamações da parte externa do órgão genital feminino (chamada vulva). a vulvite é a irritação da vulva, e a vulvovaginite, da vulva e da vagina. são provocadas, principalmente, por diversos microorganismos, que causam corrimento. as mesmas bactérias que originam a candidíase, a tricomoníase e clamídia podem causar a vulvite e a vulvovaginite.A vulvovaginite também pode ser causada pelo uso de produtos alergênicos, como calcinhas de tecido sintético, amaciantes, papel higiênico colorido ou perfumado, sabonetes perfumados, e também pelo hábito diário, como o uso do chuveirinho como ducha vaginal.
As mulheres grávidas podem desenvolver vulvites crônicas após o parto, devido a sua sensibilidade com determinados produtos químicos, o látex da camisinha, tampões vaginais e sabonetes íntimos. a imunidade baixa propicia o desenvolvimento das infecções.
Os sintomas mais comuns da vulvite e da vulvovaginite são:
1.Inflamação da vulva;
2.Vermelhidão;
3.Corrimento;
4.Prurido vulvar (coceira intensa na vulva).
Ninfoplastia (cirurgia plástica na vulva)
Um pequeno estudo realizado com jovens pacientes do hospital Royal Children's Hospital, em Melbourne, na Austrália, mostrou que o desejo de ter uma vagina como as mostradas em filmes pornográficos foi a principal motivação das pacientes analisadas pelos pesquisadores. Segundo o estudo, a visão estereotipada da genitália feminina mostrada na pornografia e a falta de referências para que as jovens comparem suas vaginas fazem algumas delas se sentirem desconfortáveis com o aspecto de suas vulvas. Não deveria ser assim, mas as 41 participantes da pesquisa, que foram atendidas entre 2000 e 2012, sofriam de ansiedade por se sentirem diferentes por causa de uma vulva que não reconheciam em outras garotas, um estado mental que os acadêmicos identificaram até em uma menina de 11 anos.
Segundo essa imagem irreal da vagina, promovida nos filmes para adultos, “os lábios menores que não se projetam à frente da borda dos lábios maiores são considerados bons, enquanto os lábios que sobressaem são vistos como ruins”. Repetindo: não há uma base clínica que sustente a harmonia dessas medidas. Na verdade, aproximadamente metade das vulvas do mundo têm os lábios menores mais destacados que os maiores, e isso não é um problema.
É claro que há casos clínicos que justificam esse tipo de procedimento para melhorar a saúde da mulher, como dor durante a relação sexual. Se a questão for apenas estética, repense se você precisa disso para ser feliz, se precisa mesmo simplesmente se adequar a certos padrões estabelecidos e extremamente inadequados e prejudiciais à sua saúde mental.
Nos ensinaram que nada em nosso corpo é suficiente. O tabu da sexualidade feminina, a invisibilidade de nossos genitais, a culpa, a vergonha que nos impede de olharmos lá para baixo, nos prejudica diariamente. A falta de conhecimento também é um motivo de rejeição. Vamos reverter esse cenário juntas.
Conheça tua vagina
A fotógrafa britânica Laura Dodsworth, cujo projeto "Womanhood" é tema do documentário do Channel 4 "100 vaginas", O filme conta a história de mulheres e pessoas não binárias por meio da imagem de suas vulvas— Eu sei que as pessoas vão achar as imagens um pouco chocantes, mas isso é uma parte crucial do meu argumento — defende Dodsworth.
Womanhood é a terceira parte de uma série de trabalhos em que Dodsworth examinou partes íntimas do corpo. Começou com "Bare Reality", que foi financiado por uma campanha de crowdfunding e apresentou cem fotografias de seios femininos.
Outro filme que vale a pena ser visto, é o ‘’Vulva 3.0’’, O documentário é o resultado de uma pesquisa não sensacionalista sobre a história da anatomia feminina, desde o século XVI até os dias atuais. Aborda a censura do corpo feminino, as proibições, a beleza do órgão feminino e os erros anatômicos, assim como as mutilações impostas a ela.