por Lian Tai, jornalista, atriz e doutora em Comunicação Social

"Você nunca mais estará sozinha” - dizem para as recém-mães, sem saber que elas provavelmente nunca estiveram tão sós. Porque, sim, pode ser extremamente solitário estar o tempo inteiro acompanhada, ainda que pelo "maior amor do mundo", como insistem em repetir nas hashtags.

É solitário acordar sozinha de madrugada para amamentar e passar noites em claro ninando um bebê. É solitário ser deixada de lado pelos velhos amigos porque uma criança não cabe nos programas do grupo. É solitário não ter assunto para conversar porque toda sua realidade é o sono e o choro de um ser humano e o mundo não se importa com ele. É solitário ser a grande responsável pela saúde e bem-estar dos filhos, sendo solo ou tendo o pai da criança ao lado, para supostamente dividir as tarefas. É solitário se dar conta da própria descartabilidade, quando te excluem dos espaços de trabalho, de estudos e de lazer.

A lista da solidão materna é longa e se alonga de acordo com o desprivilégio da mulher, a tonalidade da pele, a classe social. Mas ouso dizer que, apesar de se manifestar de diferentes formas, todas elas são marcadas pelo silenciamento. Afinal, toda mãe que se atreve a falar sobre o lado doloroso da maternidade corre o risco de se passar por ingrata ou desnaturada. Sobre ela, recai constantemente a desconfiança do não-amor pelos filhos. Vejam bem, a mãe-arquétipo das sociedades fundadas sobre o Cristianismo é Maria, mulher que é pura doação e sacrifício, tão sem desejos que é virgem. E é essa mãe impossível a régua com que somos medidas. Como, pois, dizer que nos sentimos sós, que nos sentimos exaustas e perdidas, sem o peso da culpa pelo grande pecado de não sermos Virgem Maria? Ela sim, uma "mãe de verdade".

Romper o silêncio é questão não só de coragem, mas de cercar-se das pessoas certas. Empoderamento individual é uma ilusão neoliberal, pois o empoderamento de fato só é possível coletivamente. Ainda assim, é preciso que cada mulher fale de si. É preciso que cada uma de nós, mães, possamos narrar nossas próprias experiências e lhes atribuir sentidos que não venham das narrativas que ao longo dos séculos os homens fizeram sobre nós. Falar sobre a solidão é também ser menos sós.

Resgatar a fofoca, nesse caso, é resistência. Fofoca, que em seu sentido original conotava vínculo entre mulheres e que na transição para a modernidade tornou-se palavra aviltante. Como bem explicou a filósofa italiana Silvia Federici, destruir os laços femininos era necessário para o advento do Capitalismo, pois este se fundou sobre o trabalho doméstico e não-remunerado das mulheres. E a melhor forma de elas executarem a função sem se rebelarem era convencê-las de que isso era seu sentido de vida, daí a romantização.

Reconhecer a própria solidão e falar sobre ela é desestabilizar essa engrenagem que nos engole. É apontar a exploração do trabalho das mulheres operada pelo Patriarcado. É perceber o buraco imenso deixado pelo modelo de sociedade individualista, que sobrecarrega as mães, pois, como já diz o provérbio africano, é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança.

Falar sobre a solidão materna é, portanto, questionar a estrutura capitalista patriarcal e, para que isso não aconteça, associaram exploração a amor. Questionam no ponto frágil: Você não ama? Você não queria ser mãe? - como se amar os filhos fosse sinônimo de aceitar de bom grado o sacrifício e a opressão. Como se as formas de maternagem fossem naturais e não uma construção social fundada no desequilíbrio.

Falemos, pois, falemos muito. Pois quando minha solidão encontrar a sua solidão, talvez tenhamos uma revolução.